A ansiedade de separação em cães é um problema comportamental frequente, que pode impactar seriamente a qualidade de vida do animal e a tranquilidade da família.
No Brasil, estudos apontam que uma parcela significativa dos cachorros atendidos em clínicas universitárias apresenta sinais desse transtorno, como latidos sem parar, destruição de objetos e até alterações fisiológicas quando ficam sozinhos.
Se você já chegou em casa e encontrou seu pet ofegante, agitado ou com objetos destruídos, saiba que ele pode estar passando por isso. Neste post, mostraremos como reconhecer, prevenir e tratar esse problema com segurança, embasamento científico e dicas práticas aplicáveis no dia a dia. Boa leitura!
O que é a ansiedade de separação em cães?
A Síndrome da Ansiedade de Separação (SAS) é um distúrbio em que o cão manifesta estresse e medo ao ser separado do tutor, apresentando comportamentos destrutivos, vocalização excessiva e até sintomas físicos.
Segundo Ancken e Coelho (2018), em artigo publicado na Revista de Educação Continuada em Medicina Veterinária e Zootecnia do CRMV-SP, a ansiedade de separação em cães é caracterizada como uma resposta emocional intensa diante da ausência do tutor, resultando em sofrimento ao pet e impacto direto na relação humano-animal. Longe de ser uma simples “birra” ou “manha”, trata-se de um transtorno clínico-comportamental reconhecido, que figura entre as queixas mais comuns nas clínicas veterinárias brasileiras.
Novais, Lemos e Faria Junior (2010), em estudo realizado no Hospital Veterinário de Fernandópolis (Unicastelo – SP) identificaram que 68% dos 75 cães avaliados apresentavam sinais compatíveis com ansiedade de separação. Os sintomas mais observados foram:
- vocalização excessiva (47%);
- micção inadequada (39%);
- defecação inadequada (23%);
- e comportamentos destrutivos (29%).
Esses dados reforçam a importância de compreender a SAS como um problema de saúde animal com alta prevalência, que demanda diagnóstico preciso, estratégias de manejo adequadas e, em alguns casos, acompanhamento veterinário especializado.
Quais são as causas da ansiedade de separação em cães?
Mudanças de rotina, traumas de abandono, apego excessivo e ausência de estímulos físicos e mentais.
A ansiedade de separação em cães é um distúrbio multifatorial, ou seja, não há uma causa única, mas sim a combinação de diferentes aspectos que aumentam a vulnerabilidade do animal. Entre os principais fatores destacam-se:
- mudanças bruscas de ambiente ou rotina: alterações na residência, troca de tutor, chegada de novos membros na família ou mudanças nos horários do tutor podem gerar instabilidade emocional;
- apego excessivo: cães que passam grande parte do tempo grudados em seus tutores têm maior dificuldade em lidar com a ausência;
- experiências traumáticas: abandono, longos períodos de isolamento ou vivência em abrigos sem socialização adequada;
- falta de estímulos físicos e mentais: ausência de passeios regulares, brincadeiras e desafios cognitivos aumenta os níveis de frustração e estresse.
Na prática, um dos gatilhos mais comuns está no tempo excessivo que muitos cães passam sozinhos em casa. Quando o tutor sai para trabalhar e o animal não tem atividades para se ocupar, cresce a probabilidade de desenvolver comportamentos ansiosos. Por isso, o enriquecimento ambiental — brinquedos interativos, jogos de olfato, ossos recreativos e estímulos que mantenham o cão ocupado — é fundamental para reduzir os impactos da solidão.
Soares, Pereira e Paixão, em estudo publicado na Revista Ciência Rural, reforça essa visão: cães que viveram em abrigos, privados de estímulos e socialização, apresentaram maior predisposição à ansiedade de separação. Esse achado mostra que tanto o histórico de vida quanto o ambiente atual desempenham papel decisivo no desenvolvimento do transtorno.
Como identificar os sintomas?
Os sintomas comuns incluem: latidos, choros, destruição de objetos, eliminação inadequada e sinais físicos como tremores e salivação.
A intensidade dos sintomas da ansiedade de separação em cães pode variar bastante, indo desde sinais leves de inquietação até comportamentos graves que comprometem o bem-estar do animal e a rotina da família. Alguns sinais mais comuns incluem:
- vocalização excessiva: latidos, uivos e choros persistentes quando o tutor se ausenta;
- comportamento destrutivo: roer portas, móveis e objetos da casa como forma de extravasar a frustração;
- eliminação inadequada: urinar e defecar em locais impróprios, mesmo em cães já adestrados;
- tentativas de fuga: arranhar portas, janelas ou até se machucar tentando sair para encontrar o tutor;
- alterações fisiológicas: tremores, salivação em excesso, taquicardia e, em alguns casos, vômitos ou diarreia.
Esses sinais podem surgir de forma isolada ou combinada, e a intensidade varia de acordo com o perfil do cão, sua rotina e o nível de dependência em relação ao tutor. Em muitos casos, os tutores confundem os sintomas com “desobediência” ou “birra”, quando na verdade se trata de uma resposta emocional ligada à ansiedade.
Por isso, é essencial observar mudanças de comportamento e não minimizar sinais recorrentes. Ao identificar sintomas persistentes, você deve buscar apoio de um médico-veterinário ou especialista em comportamento animal, que poderá indicar estratégias adequadas de manejo. O reconhecimento precoce evita a progressão do problema e garante mais qualidade de vida, equilíbrio emocional e bem-estar para o pet.
Como prevenir a ansiedade de separação?
Treine a independência do cão, mantenha uma rotina estável e ofereça estímulos físicos e mentais diariamente.
A prevenção é sempre o caminho mais eficaz para evitar que a ansiedade de separação se torne um problema sério. Isso vale especialmente para filhotes e cães recém-adotados, que estão em fase de adaptação e aprendizado. Criar hábitos saudáveis desde cedo ajuda o seu pet a lidar melhor com a solidão e reduz os riscos de desenvolver o transtorno.
Entre as práticas mais recomendadas estão:
- treinamento de independência: comece deixando o cão sozinho por alguns minutos e vá aumentando gradualmente o tempo de afastamento, para que ele entenda que sua saída é temporária;
- enriquecimento ambiental: utilize brinquedos interativos, jogos de olfato e petiscos escondidos, que mantêm o cão ocupado e reduzem a ansiedade;
- rotina previsível: manter horários fixos de alimentação, passeios e momentos de interação dá segurança ao animal;
- exercícios físicos regulares: caminhadas, corridas leves e brincadeiras ajudam a gastar energia acumulada, prevenindo comportamentos destrutivos.
De acordo com Spiller, Novais e Moretto, em estudo publicado na Revista Clínica Veterinária, cães que têm uma rotina rica em atividades físicas e mentais apresentam significativamente menos problemas comportamentais, incluindo a ansiedade de separação.
Outro ponto importante é que os sentidos naturais do cão podem ser explorados a favor da prevenção. O olfato, por exemplo, é uma poderosa ferramenta de estimulação mental.
Brincadeiras que envolvem busca por cheiros — como esconder petiscos pela casa, espalhar aromas diferentes em ambientes ou usar brinquedos recheáveis — ajudam a manter o cão ocupado, reduzem o estresse e fortalecem sua autoconfiança. Afinal, cachorros cheiram tudo ao redor, e esse comportamento natural pode (e deve) ser estimulado de forma positiva no dia a dia.
Em resumo, a prevenção vai muito além de evitar a solidão: trata-se de oferecer ao cão um ambiente enriquecido, rotina estável e estímulos variados, que juntos promovem equilíbrio emocional e qualidade de vida.
Como tratar a ansiedade de separação em cães?
O tratamento envolve dessensibilização, reforço positivo, enriquecimento ambiental e, em casos graves, acompanhamento profissional.
O tratamento da ansiedade de separação deve ser personalizado e gradual, já que cada cão reage de forma diferente ao afastamento do tutor. A chave é combinar técnicas de treinamento, estímulos ambientais e, quando necessário, apoio profissional. Para ajudar você nesse processo, listamos a seguir algumas das abordagens mais eficazes que podem ser aplicadas no dia a dia.
Dessensibilização gradual
Acostume o cão a sua ausência de forma progressiva: comece saindo por poucos minutos e aumente o tempo aos poucos. Isso ensina ao animal que sua saída não representa abandono.
Reforço positivo
Recompense sempre que o cão permanecer calmo, seja com petiscos, brinquedos ou elogios. Esse método fortalece a associação de ficar sozinho com algo positivo.
Enriquecimento ambiental intensificado
Brinquedos recheáveis, jogos de olfato e desafios cognitivos mantêm o cão ocupado, diminuindo o estresse e a frustração durante sua ausência.
Apoio profissional
Em casos mais graves, um veterinário comportamentalista ou adestrador especializado pode orientar protocolos de treinamento específicos e oferecer suporte adequado ao tutor. Em algumas situações, pode ser necessário o uso de medicação para ajudar o cão a enfrentar os episódios de ansiedade, sempre sob prescrição e acompanhamento profissional.
O essencial é que o tratamento seja conduzido de forma responsável e individualizada, considerando o histórico do animal, sua rotina e as necessidades específicas de cada família. Dessa forma, você garante que o seu pet supere o problema de maneira mais equilibrada, segura e duradoura.
Conclusão
A ansiedade de separação em cães é um problema comum no Brasil, mas que pode ser prevenido e tratado com paciência, estratégias baseadas em evidências e apoio especializado. Reconhecer os sinais precocemente, estimular a independência e oferecer atividades físicas e mentais diárias são atitudes fundamentais para garantir o bem-estar do seu pet.
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Referências:
NOVAIS A.L.; LEMOS D. S. A e FARIA JUNIOR D. Síndrome da Ansiedade de Separação (SAS) em cães atendidos no Hospital Veterinário da Unicastelo, Fernandópolis, SP. Ci. Anim. Bras., Goiânia, v. 11, n. 1, p. 205-211, jan./mar. 2010. Disponível em: https://revistas.ufg.br/vet/article/view/5463/6556.
SOARES G. M.; PEREIRA J. T. e PAIXÃO R. L. Estudo exploratório da síndrome de ansiedade de separação em cães de apartamento. Revista Ciência Rural, v.40, n.3, 2010. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0103-84782010000300008.
SPILLER P.R., NOVAIS A. A. e MORETTO V. M. S. Estudo descritivo sobre a síndrome de ansiedade de separação (SAS) em cães. Revista Clínica Veterinária, Ano XVII, n. 101, p.56-62, 2012. Disponível em: https://www.revistaclinicaveterinaria.com.br/especialidades/comportamento/estudo-descritivo-sobre-a-sindrome-de-ansiedade-de-separacao-sas-em-caes/?utm_source=chatgpt.com
Von Ancken A. C. B. e Coelho C. P. Uso de medicamentos ultradiluídos no tratamento da síndrome de ansiedade por separação em cães. Revista de Educação Continuada em Medicina Veterinária e Zootecnia do CRMV-SP (Revista MV&Z), v.16, n.2, 2018. Disponível em: https://www.revistamvez-crmvsp.com.br/index.php/recmvz/article/view/37792.